
1. Introdução
Realizou-se de 12 à 15 de Julho de 2021, no Centro da Congregação das Irmãs Franciscanas de Mumemo, em Marracuene, Província de Maputo, uma formação nacional sobre “Agroecologia Camponesa e Justiça Climática” destinada à rede de Promotores de Extensão Rural (PER) da UNAC. O curso enquadra-se na iniciativa da La Via Campesina – Região Austral e Oriental de África (LVC SEAf) denominada “Agroecologia alcança Justiça Justiça Climática em que as organizações membros são formadas na matéria e também recebem apoio para desenvolvimento de infraestruturas para suportar o ensino de praticas agroecológicas.
Participaram da formação um total de 31 pessoas (17 homens e 14 mulheres) 22 camponeses e camponesas PER provenientes de todas províncias do país, 3 técnicos da UNAC Sede, , Organizações da Sociedade Civil (OSC) parceiras nomeadamente: Justiça Ambiental (JA), Livaningo e Associação para o Desenvolvimento Sustentável (ABIODES).
A capacitação tinha como objectivo debater e doptar os camponeses de conhecimentos sobre melhores estratégias e práticas agro-ecológicas que facilitem o alcance da justiça climática.
Com resultado da formação foram produzidos dois documentos, designadamente: (i) plano de seguimento sobre justiça climática e agroecologia camponesa e (ii) um currículo nacional da iniciativa para a Escola de Agroecologia da UNAC e para o colectivo de PER.
O presente relatório descreve os pontos essenciais (debates, apresentações e trabalhos em grupo) levantados durante a formação e está dividido em três partes nomeadamente: (i) introdução e (ii) desenvolvimento – decurso da formação.
2. Desenvolvimento – Decurso da formação
2.1 I Dia – 12 de Julho de 2021
A abertura oficial do evento foi feita pelo Coordenador Executivo da UNAC, Luís Muchanga, que além de desejar boas vindas frisou que a formação vai ajudar os camponeses a recuperar as suas cultura e resgatar as sementes locais, para tal a UNAC apostou na metodologia camponês a camponês que valoriza o conhecimento do campesinato.
- Apresentação do projecto de Justiça Climática e Agroecologia
- A iniciativa “Agroecologia Camponesa Atinge a Justiça Climática” nasceu em 2018 como resultado da intenção dos nossos membros de criar uma narrativa partilhada sobre justiça climática e agroecologia, a fim de reforçar a capacidade da região para liderar a advocacia baseada em evidências sobre questões de justiça climática e agroecologia;
- O colectivo internacional da LVC sobre ambiente e justiça climática, bem como os colectivos sobre agro-ecologia, sementes e biodiversidade são os dois colectivos que estão directamente ligados ao colectivo regional de AE e JC na região;
- A mensagem chave que emergiu da iniciativa regional sobre justiça climática e agroecologia foi que “a agroecologia camponesa alcança a justiça climática”.
- A LVC SEAf está avançar a AE e JC através das seguintes estratégias: (i) documentação – estudos nacionais de investigação em colaboração com membros sobre alterações climáticas, agroecologia, políticas públicas incluindo a captura de alternativas desenvolvidas no seio das comunidades e desenvolvimento de estudo de base sobre Justiça climática a nível regional (SEAf); (ii) capacitação – desenvolvimento de materiais de informação e educação popular “A agroecologia camponesa alcança a justiça climática“ – cartilha, brochuras, currículo, manual para formadores. Inclui tradução dos materiais para línguas africanas, com base no sucesso da aprendizagem horizontal de camponês a camponês, a região acolheu duas visitas de troca de experiência na RDC e no Quénia, sessões de formação regionais e nacionais sobre justiça climática e agroecologia; (iii) advocacia
II. Apresentação e dabate do conceito sobre agroecologia:
No debate feito à volta deste conceito, ficaram os seguintes pontos essenciais:
- Agroecologia é uma forma de produzir sem envenenar e nem mudar a estrutura dos solos, feita através dos recursos naturais disponíveis para o camponês. Ela garante a sustentabilidade e harmonia entre o homem e a natureza;
- Agroecologia é uma das melhores formas de preservar o solo para as gerações vindouras e uma das vantagens é que não acarreta custos.
- Uma vantagem da prática agroecológica é a melhoria da fertilidade dos solos, aumento da produção nas machambas.
- Trabalho em grupo – mapeamento agroecológico
Neste exercios os participantes divididos em 3 grupos (regiao norte, centro e sul) reflectiram sobre as seguintes questões: (i) Quais as características e impactos das Mudanças Climáticas na rua regiao? (ii) Que práticas agroecológicas são promovidas ou usadas? Indique por categoria : solo, plantio, pragas e doenças, sementes, insumos, irrigação, pós-colheita. Em que zonas especificamente sao promovidas? (iii) Quais as vantages e desafios do uso dessas técnicas agroecológicas?
Das respostas e debates que saíram foram obtidos os seguintes aspectos em comum:
- As características das mudanças climáticas em todo o país são: secas, chuvas intensas, cheias, altas temperatura, ventos fortes, nevoeiros, queda de granizo. Essas mudanças climática tem como impacto: as queimada descontroladas, abate das árvores, fome, inundações, perda de culturas, propagação de insectos e pragas.
- Práticas agroecológicas promovidas: no solo (usa-se adubação verde, rotação e consorciação de culturas, cobertura viva ou morta, produção de compostos orgânicos), plantio (incorporação de estrumes, compostagem antes ou depois do plantio), combate à pragas e doenças (pulverização de biopesticidas feita através da calda de alho, piri-piri, tabaco, cinza e sabão), semente (uso de sementes nativas ou locais), insumos (esterco de animais, compostagem, fertilizantes orgânicos e biopesticidas), irrigação (gota a gota e manual), pós-colheita (consumo, conservação de sementes em panelas de barro, comercialização.). Estas práticas são promovidas principalmente em zonas altas e baixas;
- Vantagens de técnicas agroecológicas:fortifica e conserva o solo, aumento da produção e produtividade, sustentabilidade do solo, combate a erosão, desenvolvimento das plantações, alimentos saudáveis e nutritivos, baixos custos de produção.
- Desafios de técnicas agroecológicas:processamento dos produtos, comercialização a preço justo, acesso ao mercado e transporte, realização de réplicas nas comunidades, abertura de campos de demonstração.

2.2 II Dia -13 de Julho
No segundo dia da formação, reservado à trabalho de campo, escalou-se a Associação Samora Machel II, com vista a conhecer o local e trocar experiências das práticas agroecológicas promovidas pelos membros da associação, e a Escola de Agroecologia da UNAC, no distrito da Manhiça.
- Associação Samora Machel II
Com vista a melhoria da produção os membros destacaram os seguintes técnicas de produção Associação Samora Machel II foram destacadas a seguintes propostas:
- Uso do compasso para o espaçamento entre as plantas;
- Enriquecimento do solo através das técnicas e práticas agroecológicas;
- Uso de técnicas agro-ecológicas para combate de pragas (folhas de papaieira, minhocas, aguardente, alho, etc.)
- Definição da finalidade do valor obtido na produção.
- Escola de Agroecologia da UNAC
Na visita às futuras instalações da Escola agroecológicas da UNAC, oportunidade que serviu para perceber o projecto de implantação de infraestrutura, e a integração animal nos processos de produção agroecológicos. Foi também facilitado no local o tema sobre gestão de fertilidade de solos:
- Como parte do projecto de “Agroecologia alcança Justiça Climática”, além do treinamento nacional sobre Agroecologia e Justiça Climática, os membros da LVC beneficiam-se de um fundo para implantação de infraestrutura para suportar os processos agroecológicos das Escolas de Agroecologia. Neste sentido, a UNAC irá construir capoeiras para criação de galinhas tradicionais, cabritos e coelhos para fomento de modo a garantir a sustentabilidade financeira da Escola e também a usar os excrementos dos animais para fertilizar a horta. Os animais serão vendidos para cobrir as despesas fixas de manutenção da Escola;
Gestão de fertilidade dos solos: para o melhoramento da fertilidade do solo é necessário praticar adubação orgânica, lavoura mínima, o ideal é de 15 centímetros, rotação de culturas para evitar doenças, evitar queimadas, pois influenciam para o enfraquecimento dos solos, produzir estrume ou usar estrume de animais. Durante o debate, os participantes destacaram que o método mais usados para fertilizar o solo é a cobertura morta que pode ser feita com os restos de amendoim, feijão e milho.
2.3 III Dia – 14 de Julho
- Apresentação sobre a soberania alimentar
- A Soberania Alimentar (SA) é o direito dos povos a uma alimentação segura e adequada, produzida por métodos ecologicamente correctos e sustentáveis, é o direito a definir os seus próprios sistemas alimentares e agrícolas;

- A SA coloca as aspirações daqueles que produzem, distribuem e consomem alimentos no centro dos sistemas e políticas alimentares, em vez das exigências dos mercados e corporações;
- Dá prioridade às economias e mercados locais e nacionais, e promove um comércio transparente que assegura um retorno justo a todos os sectores dos sistemas alimentares;
- Assegura que os direitos de utilização e gestão da terra, territórios, água, sementes, gado e biodiversidade estão nas nossas mãos, os produtores de alimentos – camponeses e camponesas.
- A SA assenta nos seguintes pressupostas: (i) politicas publicas – credito, subsidio, extensão e infraestrutura, (ii) mercado local – protecção do mercado local, gestão da oferta, processamento local, (iii) agricultura sustentável – conhecimento do camponês, sementes locais e sem químicos, (iv) organizações de camponeses – posições politicas, guardiões do conhecimento local, representação dos interesses locais;
- A luta da SA é contra o domínio multinacional sobre os processos alimentares, e contra as organizações nacionais e multinacionais que colocam em causa a soberania camponesa e os interesses dos povos.
- Apresentação sobre Mudanças Climáticas e Justiça Climática
- Mudança climática é uma mudança do clima atribuída diretamente ou indiretamente à atividade humana que altera a composição da atmosfera global e que em adição a variabilidade natural do clima é observado sobre longos períodos de tempo.
- Historicamente, os países mais industrializados são os resposáveis pela maior parte da emissões globais de gases de efeito estufa. Estas emissões são através de queima de combustíveis fósseis (75% emissoes de CO2), emissões pelo uso da terra (25% das emissões de CO2).
- O conceito de Justiça Climática refere ao equilíbrio criado através do uso sustentável dos recursos que conduz à uma estabilidade do clima. Justiça Climática é uma luta para transformar o sistema econômico global e para a justa redistribuição de recursos. É uma luta contra as estruturas de poder que dão autoridade a uma elite corporativa que, apesar de ter causado a crise climática, também recebe o mandato para resolvê-la.
- A construção da da Justoca Climatica assenta nos seguintes elementos: (i) Sistema alimentar: abordar as desigualdades no sistema alimentar trazendo a agroecologia camponesa como modelo para o sistema alimentar; (ii) Academia: pesquisas independentes que demonstram soluções que podem ajudar a mitigar e adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas; (iii) Agroecologia camponesa é um modo de vida que trata a Terra com respeito e cuidado, não como um recurso a ser explorado.
- Popularização da Justiça Climática deve ser feita através de: (i) Mobilização: construir solidariedade com e entre as comunidades vítimas da injustiça climática e simpatizantes da JC, (iii) Movimento pela Agroecologia Camponesa e pela Soberania Alimentar – confronta diretamente o poder que é construído em torno do controle corporativo sobre recursos como sementes, fertilizantes, terra e água; (iv) Reconhecimento e empoderamento da mulher – as mulheres desempenham um papel particularmente crítico no sistema alimentar global pois são, as principais produtoras de alimentos e guardiões da biodiversidade e das sementes agrícolas; (v) Jovens: Os Jovens estão se mobilizando em torno da agricultura urbana, retornando à terra, construindo a soberania alimentar comunitária ou trabalhando pela justiça social em qualquer capacidade.
- Soberania de sementes para os camponeses
- Os sistemas de sementes envolves actividades relacionadas à: (i) produção de semente, (ii) multiplicação, (iii) processamento, (iv) comercialização e por fim (v) uso da semente pelo produtor/camponês. De foma geral os sistemas de sementes sao classificados em 2, nomeadamente: (i) sistema formal de sementes e (ii) sistema informal de sementes ou sistema de sementes gerido pelos camponeses;
- Também denominado Sistema de Sementes Gerido pelos Camponeses/Agricultores (SSGA) o sistema informal de sementes é caracterizado por ser um sistema tradicional de conservacao, producao, troca e gestao de sementes pelos camponeses e comunidades por forma a alcancarem os seus requisitos para producao. As maior parte dos camponeses depende deste sistema e nos paises em desenvolvimento 90% usa esta semente e tem nela a base garantir a subsistencia e seguranca alimentar das comunidades e familias camponesas;
- O quadro legal de sementes em Moçambique, em especial o regulamento de sementes (Decreto 12/13), não menciona e nem reconhece o sistema informal apesar da sua importância esmagadora em Moçambique. Este, exclui e criminaliza a comercialização de sementes geridas pelos camponeses e defende que as sementes que não passam pelo processo de certificação e não cumpre com as normas regulatórios e fitosanitários de exportação não são consideradas de sementes mas sim grãos;
- Harmonização das leis de sementes significa que todos os países num bloco regional aplicarão os mesmos sistemas de libertação de variedades, os mesmos procedimentos de certificação e de testes e as mesmas medidas fitossanitárias para a produção e distribuição de sementes
- O Impacto da harmonização das leis de sementes para os camponeses e para o sistema de sementes geridos pelos camponeses é que leis de sementes harmonizadas valorizam somente que são desenvolvidas para agricultura industrial/sector formal.
- Negam aos camponeses dentro de uma região de a oportunidade de apoio e de operar dentro de outro tipo de agricultura, como a agroecologia.
- IV Dia – 15 de Julho
O ultimo dia da formação foi reservado para elaboracao do curriculo de agroecologia e justice climatica e para elaboracao do plano de seguimento da formacao. Os dois documentos foram elaborados atraves de debate e discussoes em grupos:
- Currículo de Agroecologia e Justiça Climática
Neste exercício os participantes deviam reflectir em torno da construção do currículo nacional da iniciativa para a escola de agroecologia da UNAC, onde partilharam as seguintes ideias:
- Na componente prática de agroecologia o currículo deve setrazer os conceitos sobre agroecologia, sua aplicação, vantagens, rotação de culturas, conservação de sementes nativas, renovação do solo, combate à doenças e pragas e aplicação do esterco animal;
- Na componente sobre a justiça climática o currículo, deve-se promover e firmar parcerias com o governo distrital, pronvicial e convidá-los a participar de eventos onde serão debatidas as desvantagens do uso dos produtos químicos que prejudicam os solos, efeitos das mudanças climáticas para consciencializá-los sobre a justiça climática, envolver os líderes comunitários, a comunidade na luta contra injustiça climática, realizar marchas e palestras na comunidade falando sobre a importância da participação na luta contra a injustiça climática.
- Os parceiros (OSC nacionais, provinciais ou organizações comunitárias de base) que podem ser aliados da iniciativa “Agroecologia atinge Justiça Climática” identificou-se: Justiça Ambiental (JA), Livaningo, ABIODES, Observatório do Meio Rural (OMR), Organização Rural de Ajuda Mútua (ORAM) e We Effect.